sexta-feira, 18 de abril de 2008

O CORPO FORA DO CORPO


O CORPO FORA DO CORPO
Uma moral da liberdade


“Abandonai as cavernas do ser. Vinde o espírito se revigora fora do espírito. Já é hora de deixar vossas moradas.”
Antonin Artaud.


O corpo é uma ficção ou um meio objetivo do conhecimento?
Se nos aliarmos ao pensamento de Antonin Artaud podemos chegar aos dois caminhos, mas qual é o verdadeiro, é possível uma integração ou uma dialética ascendente até a eliminação de ambos?
Entre as condições que temos para adquirirmos conhecimento, o corpo foi colocado de lado como que uma barreira para ele, o corpo desde Platão era algo para ser superado, pois este nada mais era do que uma imagem aparente do real, que estava além, no mundo das formas, mas esta substancia que Platão admitia como reais só podiam ser alcançadas, enquanto encarnado, pelo extremo exercício da razão.
Na idade média o pensamento sobre o corpo é mais que claro, anulado, pois a alma é divina e o corpo um campo fértil para o pecado.
Já na modernidade a razão é soberana, em Kant, o princípio de imperativo já deixa certa a opção pela razão, totalmente fora da experiência, deixando a moral a mercê de um mundo racional, que não se apóia senão em si mesmo, descartes também vai determinar o pensamento como único a existir visto que a partir da dúvida podemos chegar à conclusão que ele não existe, por isso a famosa frase: penso logo existo; o pensamento não o corpo.
Mas como um dos últimos, senão o último moderno, Nietzsche é quem vai colocar o corpo na história ocidental de forma consistente, sua teoria busca instaurar novamente o dionisíaco na vida moral, nas relações humanas, e vai identificar nesta razão, para Nietzsche desde Sócrates, o fim e a morte para a raça humana, esta razão sempre busca colocar rédeas nos espíritos livres, homens que são capazes de mudar e comandar sua vida, com a potência necessária para torná-la digna de ser vivida, mas esta razão intenta tornar estes homens obedientes para que os fracos possam assumir o mundo.
Esta tentativa de domesticar certos espíritos livres é notável, na história homens como: Copérnico, Galileu, Baudelaire, Rimbaud, Byron, o próprio Nietzsche, tentaram traçar novos parâmetros para a Moral e foram taxados de loucos, pois quando queremos destituir alguém de valor nada melhor que denunciar sua loucura, que está destituída de razão.
Mas quem disse que os loucos estão destituídos de pensamento.
Esta é uma manobra, dispositivo, como acrescenta Foucault de forma brilhante, são exatamente as formas com as quais a moral dos fracos estaciona o avanço dos visionários.
O corpo é então colocado de lado como uma forma de controle, mas o que ele tem que pode causar tanto alvoroço? Ele é tão perigoso que precisa ser anulado? Podemos partir da inversão do pensamento racional, tudo que é adquirido pela percepção é irracional, mesmo para os fenomenólogos, o entendimento dos fenômenos é parte de uma explicação do mundo, nunca tocamos as coisas, somente os fenômenos, mas também para chegar a uma certa racionalidade.
Mas o que é o contato com o mundo, porque nosso corpo é dotado de tais sentidos?

Nossos sentidos nos dão um panorama da realidade, ou pelo menos parte dela, mas é quando os ampliamos é que chegamos a estados de consciência que nos possibilitam tocar mais profundamente nas esferas de percepção mais distantes, há momentos que podemos chegar a estados que estão para além da percepção sensorial, porém estes estados não são a “Razão Pura” kantiana, talvez estejam mais próximos do mundo das idéias platônico.
Muitos chegaram a estes estados, de varias formas, a sociedade contemporânea muito pressionada pela razão, busca seu escape nas drogas e no comércio, como formas de chegar a momentos de loucura, de desvario, mas sem sair do meio instituído. Há, porém quem encontre este caminho pela ascese, como é o caso dos místicos, estes através de práticas bem definidas podem alcançar estes estados. O corpo como uma folha em branco em que escrevemos a consciência ou como sujeito doador de sentido, é um memorial de conhecimentos, que ficam gravados, como numa HD, muitos dos contatos que travamos com o mundo estão nele, mas por um dispositivo de controle não o podemos acessar. Portanto para Artaud é necessário morrer em vida, arriscar, Jouer.

De qualquer forma este conhecimento é imediato e não mediado pela razão e é adquirido pela intuição, o corpo é sua principal forma de contato, sabemos que é um conhecimento em sua total complexidade, mas não é aceito como a razão por que não interessa para os mecanismos de controle da sociedade, estes são como que entidades abstratas que estão nos administrando sem que possamos saber.
Precisamos criar zonas autônomas que possibilitem espaços de fluência e liberdade, pois esta só é possível em estados de elevação da consciência; Liberdade é, portanto a capacidade de conhecer propriamente a realidade que esta sob um véu, mas que podemos rasgar; rasgar a realidade.
Portanto quando nosso mártir nos apresenta a saída da vida, da morada, ele nos alerta que precisamos sair do corpo para estar nele, este paradoxo é próprio das invocações da magia, somente iniciados sabem ler esta sentença, mas podemos dizer que estar fora do corpo é abandonar a vida como a conhecemos. É abandonarmo-nos em devaneios durante a vigília, é um translúcido, diáfano.
Ficelle

Um comentário:

JIMMY AVILA disse...

Ola Will!

Primeiramente, parabens pelo bolg.
Gostei do ensaio de abertura, bem
informativo e denso.
Essa divisao de corpo e mente, invariavelmente repudiando o primeiro,sempre permeou o pensamento folosofico desde a idade media, como voce mesmo disse.
Acho que com Descartes a ideia assume uma formulaçao definitiva, até entao,e muitos vao toma-lo como paradigma.

Porém, em tempos recentes a Piscologia&Filosofia Cognitiva e a Neurologia fizeram grandes descobertas nesse campo que fizeram com que nosso entendimento
dessa questao avançasse extraodinariamente.
Falo de gente como Antonio Damasio, neurologista portugues,que com trabalhos como:
O ERRO DE DESCARTES e EM BUSCA DE ESPINOSA, mostou que a emoçao esta totalnente ligada a razao e nao pode funcionar sem ela.Mas o que é mais interessante, descobrir que o corpo e os mecanismo fisiologicos tem papel
vital na açao do pensamento e da conciencia.
Nao se pode deixar de conecer os livros de OLIVER SACKS, que ja teve ate filme baseado em sua obra, e DANIEL DENNETT, entre outros.
ë isso, espero que goste.
um grande abraço